Cura e Medicina
Vincent Cheung
Muitos cristãos são muito dependentes da ciência médica e quase nunca buscam cura em Deus. Alguns oram pela cura apenas nos casos mais extremos, e outros não pensam em orar pela cura mesmo assim. Poucos esperam milagres. Devemos condenar essa tendência de excluir Deus da área da saúde. Embora a Bíblia pareça permitir o uso da medicina, ela não a encoraja explicitamente. Além disso, ela adverte contra olhar para a medicina como um substituto para buscar a cura de Deus:
No trigésimo nono ano de seu reinado, Asa foi atacado por uma doença nos pés. Embora a sua doença fosse grave, não buscou ajuda do SENHOR, mas só dos médicos. Então, no quadragésimo primeiro ano do seu reinado, Asa morreu e descansou com os seus antepassados. (2 Crônicas 16:12–13)
Como indicam os versículos anteriores, Asa começou a se afastar de Deus e seu coração se endureceu (16:1–10). Quando o coração de um homem está endurecido, ele se volta para soluções humanas em vez de buscar a Deus com fé e arrependimento. Assim como ele confiava nas alianças humanas na guerra, agora ele confiava nos médicos na doença.
Este é o principal impulso por trás da doutrina do cessacionismo. Aqueles que afirmam esta heresia afirmam ser zelosos em defender a suficiência e conclusão da Bíblia, mas são mentirosos, pois se eles se importam tanto com a Bíblia, eles obedeceriam ao que ela diz sobre a cura. Apesar da esmagadora abundância de mandamentos, promessas e exemplos sobre o assunto, eles continuam determinados a parar de confiar no poder milagroso de Deus para sua saúde e, em vez disso, recorrem aos médicos. Além disso, eles têm como missão impedir que outros confiem em Deus para milagres de cura, e eles fazem isso até mesmo em nome de Jesus. Mesmo quando eles honram a Deus com os lábios, seus corações estão longe dele. Este é o espírito de incredulidade e assassinato que Jesus condenou nos fariseus, que crucificaram Cristo em nome de Deus.
Existem inúmeras tentativas de justificar a total dependência da medicina e a falta de fé na cura bíblica.
Uma delas afirma que a maioria dos médicos eram adoradores de ídolos e apelavam para poderes demoníacos para curar. Assim, foi um sinal de apostasia para Asa procurar os médicos, não porque fossem médicos, mas porque eram adoradores de ídolos. Portanto, o argumento é que nossa passagem não deve nos impedir de procurar médicos modernos.
Esta é uma desculpa estúpida. Muitos médicos são católicos, budistas, entre outras coisas, e são adoradores de ídolos. Mesmo que muitos outros não sejam adoradores de ídolos nesse sentido tradicional, eles são ateus e evolucionistas. Ateus e evolucionistas são muito melhores que católicos e budistas? Certamente, muitos médicos são firmemente anticristãos em suas crenças e tratam os doentes com base nisso. Se procurar médicos era errado no passado porque eles eram adoradores de ídolos, então é discutível que procurar médicos no presente é ainda pior.
Outro argumento é que a ciência médica era muito primitiva. Os médicos frequentemente faziam mais mal do que bem porque careciam das teorias e tecnologias superiores de hoje. No entanto, nossa passagem afirma que Asa morreu porque não buscou a Deus e não porque a ciência médica não era avançada o suficiente. Esse argumento expõe ainda mais a doença espiritual por trás dessa perspectiva — os proponentes se esquecem de Deus e se voltam para um foco prático.
A ciência médica costuma ser ineficaz e, para muitos, permanece inacessível e inviável. A mulher que sofria de um problema de fluxo de sangue “padecera muito sob o cuidado de vários médicos e gastara tudo o que tinha, mas, em vez de melhorar, piorava” (Marcos 5:26). Hoje, dezenas de milhares de pessoas ainda podem se identificar com isso. Isso em si pode não ser um argumento contra buscar ajuda da ciência médica, mas mostra que mesmo que estejamos preocupados apenas com o efeito prático em vez da fé em Deus, ela ainda não avançou a ponto de não precisarmos mais de Deus para nos curar. No entanto, mesmo que a ciência médica seja totalmente eficaz, acessível e viável, isso ainda não se torna um argumento para buscar a cura na medicina em vez do poder de Deus.
Então, alguns afirmam que nossa passagem não nos impede de consultar os médicos, mas adverte contra depender deles a ponto de excluir Deus do processo de cura. Ou seja, se nossa dependência primária permanecer em Deus, podemos procurar ajuda médica em paz. Assim, J. Barton Payne escreve: “O pecado do rei consistiu em recorrer ‘só’ [aos médicos] e não buscar ‘ajuda do Senhor’”.¹
No entanto, a palavra “só” foi adicionada na NVI [NIV] e em várias outras traduções, talvez para acomodar esse preconceito. A tradução mais literal da NASB diz: “E no trigésimo nono ano de seu reinado, Asa adoeceu em seus pés. Sua doença era grave, mas mesmo em sua doença ele não buscou o SENHOR, mas os médicos” (2 Crônicas 16:12; veja também KJV e ESV).
No entanto, mesmo se permitirmos que a palavra “só” permaneça, isso enfatizaria a total dependência de Asa dos médicos, mas não justificaria necessariamente alternativas como buscar a cura de Deus e dos médicos, de Deus por meio dos médicos, ou principalmente de Deus e secundariamente dos médicos. Além disso, se nossa dependência principal é verdadeiramente de Deus, devemos primeiro nos concentrar na fé, na oração e nos milagres, em vez da medicina. Assim, este argumento sai pela culatra. De qualquer forma, a passagem distingue entre buscar a Deus e buscar médicos, de modo que Asa “não buscou o Senhor, mas os médicos”.
Há uma série de passagens bíblicas que as pessoas distorcem para justificar sua dependência da medicina. Em primeiro lugar, usaremos Tiago 5:14–15 como um caso representativo, pois a discussão sobre esta passagem também se aplica às outras.
Entre vocês há alguém que está doente? Que ele mande chamar os presbíteros da igreja, para que estes orem sobre ele e o unjam com óleo, em nome do Senhor. A oração feita com fé curará o doente; o Senhor o levantará. E, se houver cometido pecados, ele será perdoado.
Donald Burdick diz que devemos considerar “essa aplicação de óleo como medicinal, e não como sacramental”. Afinal, “é um fato bem documentado que o óleo era um dos remédios mais comuns dos tempos bíblicos… É evidente, então, que Tiago está prescrevendo orações e remédios”.²
Devemos ficar felizes porque nem todos os eruditos da Bíblia são tão estúpidos e tendenciosos. Por exemplo, E. Gibson escreve: “Se… o óleo foi usado como um remédio real, (1) por que deveria ser administrado pelos presbíteros? e (2) por que a cura imediatamente posterior é atribuída à ‘oração da fé’? Essas questões parecem sugerir que o óleo foi ordenado por São Tiago mais como um símbolo externo do que como um remédio real”.³ E Alexander Strauch escreve: “Tiago certamente não é ingênuo o suficiente para acreditar que o óleo é curativo para todas as doenças. Podemos presumir que, se o óleo fosse necessário para fins medicinais, ele teria sido aplicado muito antes da visita dos presbíteros… A tarefa dos presbíteros é orar pela cura e, de acordo com o versículo 15, é a oração da fé — não a óleo — que restaura o enfermo… O óleo, portanto, deve ter tido um significado simbólico”.⁴
Tiago não diz que os presbíteros devem orar pela cura e os médicos devem administrar o óleo, mas que os presbíteros devem fazer as duas coisas. Se o óleo representa remédio, então a aplicação moderna deve ser que os pregadores devem prescrever remédios e realizar cirurgias nos membros da igreja. O texto exclui a noção de que Deus curaria por meio do óleo, porque afirma que é a oração da fé que cura o enfermo e não oferece ao óleo nenhum crédito na cura. Se a Bíblia ensina que Deus também cura por meio de substâncias naturais, o faz em outro lugar, porque este texto não diz isso.
Se o óleo for medicinal e suficiente para curar, então seria desnecessário orar pela cura, mas a passagem credita apenas a oração da fé pela cura. Não há nenhuma implicação de que o óleo tenha algum papel na cura da pessoa. Por outro lado, a Bíblia registra numerosos casos em que Deus curou os casos mais extremos e até ressuscitou os mortos em resposta à oração sem o uso de substâncias naturais. Assim, a oração por si só é suficiente, e isso significa que é desnecessário combinar a oração com a medicina ao receber a cura de Deus.
Mesmo que o óleo tenha propriedades curativas, ele não pode curar todas as doenças, mas Tiago não estabelece limites para os tipos de doenças que podem ser curadas pela oração da fé. Então, a maioria das pessoas concordaria que os remédios modernos são muito mais eficazes do que uma aplicação externa de óleo no corpo. No entanto, Tiago não diz para usar remédio, mas óleo. Seria arbitrário afirmar que poderíamos obedecer à passagem usando qualquer remédio que quiséssemos para a situação. Se uma pessoa forçar o texto a se tornar a base para o uso de remédios, isso permitiria que ela usasse apenas óleo. Em vez de torcer o texto para fazê-lo render interpretações impossíveis, seria mais fácil admitir que ele não tem fé suficiente para a cura e que não se preocupa em encontrar na Bíblia uma base verdadeira para o uso da medicina.
Não há justificativa para mudar “água” para “líquido” no batismo, de modo que possamos usar café expresso, ou para mudar “pão” para “alimento” na comunhão, de modo que possamos comer lula em seu lugar. E não há justificativa para mudar “Jesus” para “entidade” no evangelho, de modo que a fé em Cristo se torne o mesmo que a adoração a Satanás. No entanto, quando um erudito da Bíblia está determinado a promover seu próprio desejo, acomodar o mundo e legitimar sua incredulidade e rebelião, o resultado pode ser batismo expresso, ceia de lula e adoração de demônios. Assim, “óleo” se torna “remédio”.
De fato, não é exagero mencionar a adoração falsa neste contexto. Quando os israelitas foram picados por serpentes venenosas, Deus instruiu Moisés a fazer uma serpente e colocá-la em uma haste, e quando aqueles que foram picados pelas serpentes olhassem para ela, eles seriam curados (Números 21:4–9). O objeto não tinha poder para curar as pessoas, mas simbolizava a vinda da expiação de Cristo, que se tornaria uma maldição na cruz para que pudesse salvar seu povo.
No entanto, os israelitas o transformaram em um ídolo e queimaram incenso nele até a época de Ezequias. Era um mero símbolo, e o rei foi elogiado por destruí-lo (2 Reis 18:1–4). Se um símbolo se torna mais do que um símbolo na mente das pessoas e começa a compartilhar um lugar com Deus ou até mesmo tomar o lugar dele, então seria melhor destruir o símbolo para que as pessoas possam olhar para a realidade novamente.
Quanto àqueles que encorajam as pessoas a olhar para o símbolo como a realidade ou como compartilhar um lugar com a realidade, eles são, por definição, falsos mestres que promovem a adoração de ídolos. O óleo em nosso texto não tem poder de cura, mas é um mero símbolo para lembrar o enfermo do poder e da presença de Deus, para que ele possa olhar para Cristo, que tomou as nossas enfermidades e levou as nossas doenças (Mateus 8:17). Quando os eruditos bíblicos elevam o óleo a algo que contém a realidade da cura, mesmo quando um texto credita apenas a fé no Senhor para curar, então eles se tornam falsos mestres que levam o povo de Deus à adoração de ídolos.
Isso é mais sutil e sinistro do que a adoração aberta de ídolos. Foi Moisés quem fez a serpente de bronze, mas ela se tornou uma falsa adoração quando o povo a transformou em algo que não era. Da mesma forma, Tiago foi quem instruiu o uso do óleo, mas também se torna uma falsa adoração quando os eruditos o transformam em algo que Tiago nunca pretendeu. Eles se tornaram agentes de Satanás para espalhar a incredulidade e a rebelião. A noção de que isso pode ser uma reação exagerada é uma evidência da eficácia desse tipo de engano sutil.
A interpretação correta é que o óleo é um mero símbolo, nada mais. Se a Bíblia permite o uso de remédios, essa passagem não ensina, mas ensina que Deus curará quando orarmos com fé.
Outra passagem que algumas pessoas usam para justificar sua dependência de remédios vem de 2 Reis 20:1–7.
Naquele tempo Ezequias ficou doente e quase morreu. O profeta Isaías, filho de Amoz, foi visitá-lo e lhe disse: “Assim diz o SENHOR: ‘Ponha em ordem a sua casa, pois você vai morrer; não se recuperará’”.
Ezequias virou o rosto para a parede e orou ao SENHOR: “Lembra-te, SENHOR, como tenho te servido com fidelidade e com devoção sincera. Tenho feito o que tu aprovas”. E Ezequias chorou amargamente.
Antes de Isaías deixar o pátio intermediário, a palavra do SENHOR veio a ele: “Volte e diga a Ezequias, líder do meu povo: Assim diz o SENHOR, Deus de Davi, seu predecessor: ‘Ouvi sua oração e vi suas lágrimas; eu o curarei. Daqui a três dias você subirá ao templo do SENHOR. Acrescentarei quinze anos à sua vida. E livrarei você e esta cidade das mãos do rei da Assíria. Defenderei esta cidade por causa de mim mesmo e do meu servo Davi’.”
Então disse Isaías: “Preparem um emplastro de figos”. Eles o fizeram e o aplicaram na úlcera; e ele se recuperou.
O argumento deles é que Deus curou Ezequias por meio dos figos, de modo que é apropriado usar remédios como forma de receber a cura de Deus.
No entanto, essa interpretação sofre críticas semelhantes à afirmação de que Tiago incentiva o uso de remédios. Se os figos fossem suficientes para curar, os médicos do rei os teriam aplicado muito antes da chegada do profeta. Mas se o poder de Deus sozinho era suficiente para curar, isso significa que os figos eram desnecessários.
Além disso, foi o homem de Deus quem anunciou a cura e prescreveu os figos, não os médicos. Assim, o texto se recusa a acomodar aqueles que desejam extrair dele um aval para médicos e remédios. Simplesmente ele não ensina o que eles querem forçar a Bíblia a ensinar.
Outro exemplo às vezes usado para apoiar a dependência da medicina vem do ministério de Jesus:
Ao passar, Jesus viu um cego de nascença… Tendo dito isso, cuspiu no chão, misturou terra com saliva e aplicou-a aos olhos do homem. Então disse-lhe: “Vá lavar-se no tanque de Siloé” (que significa “enviado”). O homem foi, lavou-se e voltou vendo. (João 9:1, 6–7)
Mesmo os eruditos bíblicos, tão acostumados a subverter a palavra de Deus a fim de promover sua tradição e justificar sua incredulidade, hesitam em afirmar que este é um caso em que um remédio natural é aplicado em conjunto com o poder divino. Se a mistura de lama e saliva pode restaurar a visão, ou mesmo ajudá-la um pouco, então mesmo os incrédulos devem ser capazes de realizar a cura.
Talvez o homem tenha nascido sem olhos, e Jesus os criou como Deus criou o corpo de Adão da terra, mas de fato não há necessidade de especular sobre o motivo pelo qual ele usou lama. É evidente que Jesus curou o cego por poder sobrenatural, e qualquer substância natural não poderia servir a nenhum propósito medicinal em um caso como este.
Marcos 2:17 é um versículo popular usado para apoiar a dependência de remédios: “Não são os que têm saúde que precisam de médico, mas sim os doentes” (Marcos 2:17). A partir disso, eles argumentam que Jesus endossou a ciência médica. No entanto, a passagem aborda assuntos espirituais. Jesus estava oferecendo uma analogia que as pessoas entenderiam — o pecado para a alma é como uma doença para o corpo, e o fato de serem pecadores os tornava aqueles que precisavam dele.
Durante uma refeição na casa de Levi, muitos publicanos e pecadores estavam comendo com Jesus e seus discípulos, pois havia muitos que o seguiam. Quando os mestres da lei que eram fariseus o viram comendo com pecadores e publicanos, perguntaram aos discípulos de Jesus: “Por que ele come com publicanos e pecadores?” Ouvindo isso, Jesus lhes disse: “Não são os que têm saúde que precisam de médico, mas sim os doentes. Eu não vim para chamar justos, mas pecadores”. (Marcos 2:15–17)
A declaração de Jesus não pode ser tomada como sua receita para os enfermos, porque ele mesmo curou multidões de pessoas com poder milagroso, e nunca as encaminhou aos médicos. Aqueles que afirmam que o versículo representa sua suposição de que os enfermos devem procurar os médicos também devem insistir que Jesus nunca praticou o que pregou — nem uma vez. Portanto, a interpretação é blasfêmia.
Além disso, Jesus comissionou seus discípulos a curar os enfermos e expulsar demônios. Não há registro deles encaminhando alguém aos médicos para cura e exorcismo. Se o versículo afirma que a ciência médica é a solução normal para a doença, então Jesus e seus discípulos nunca o seguiram. Ou seja, Jesus nunca praticou o que pregou, e seus discípulos nunca obedeceram ao que ele ordenou. A interpretação difama as figuras fundamentais da fé cristã.
Por outro lado, quando a Bíblia se dirige ao doente, ela o instrui a chamar os presbíteros e pedir oração. A oração da fé curará o doente; o Senhor o levantará. Se ele pecou, ele será perdoado (Tiago 5:14–15). Não lhe diz para chamar o pregador para ajudá-lo a receber o perdão e depois chamar o médico para ajudá-lo a receber a cura.
Quando a Bíblia se refere aos médicos no contexto da cura física em vez de uma mera analogia, ela não os retrata como eficazes: “E estava ali certa mulher que havia doze anos vinha sofrendo de hemorragia. Ela padecera muito sob o cuidado de vários médicos e gastara tudo o que tinha, mas, em vez de melhorar, piorava” (Marcos 5:25–26). Jesus tinha isso em mente quando disse: “Não são os que têm saúde que precisam de médico, mas sim os doentes”?
Jesus não quis dizer que os fariseus não eram pecadores, mas ele estava dizendo a eles porque ele estava comendo com pecadores — eles precisavam dele. Os fariseus endureceram seus corações e se recusaram a admitir que também eram pecadores e que precisavam dele tanto quanto. Da mesma forma, aqueles que tentam se apropriar de versículos bíblicos para justificar sua dependência da medicina endurecem seus corações e se recusam a admitir que, apesar dos avanços na ciência médica, Deus ainda está realizando milagres de cura e que precisamos desses milagres tanto quanto antes.
Outra tentativa popular aponta que Lucas era médico, e Paulo se referiu a ele como “o médico” (Colossenses 4:14). Isso deveria legitimar a ciência médica. No entanto, todos tinham uma identidade ou profissão antes de seu envolvimento no ministério. Pedro era um pescador que se tornou apóstolo, mas isso não nos diz nada sobre sua profissão de pescador.
Mateus era um publicano que se tornou apóstolo, mas sua profissão era abertamente desprezada. Visto que os publicanos muitas vezes eram desonestos e opressivos, a Bíblia até os identifica com os pecadores (Mateus 18:17). Mas na lista dos doze apóstolos, ele ainda é chamado de “Mateus, o publicano” (Mateus 10:3). Depois, Hebreus 11:31 e Tiago 2:25 referem-se a “Raabe, a prostituta”, mesmo no contexto de sua fé. Quanto a Paulo, ele era um fariseu que perseguia e assassinava cristãos, e que depois se tornou apóstolo. Tudo isso não sugere que a Bíblia endosse fraude e extorsão, prostituição, assassinato e coisas assim.
Portanto, o simples fato de Lucas ser médico não contribui para nossa discussão. É possível que Paulo tenha mencionado a profissão de Lucas apenas como forma de identificá-lo. Na Bíblia, não nos é dito se ele continuou a exercer a medicina — o próprio Lucas registrou apenas milagres de cura — e suas realizações nunca são associadas à sua profissão de médico.
Existem várias passagens que dão algum suporte ao uso de meios naturais; no entanto, eles ainda não apóiam a ciência médica tanto quanto as pessoas pensam.
Um versículo que pode afirmar o benefício do exercício físico é 1 Timóteo 4:8: “O exercício físico é de pouco proveito; a piedade, porém, para tudo é proveitosa, porque tem promessa da vida presente e da futura”. A NASB diz: “a disciplina corporal é de pouco proveito”. É possível que Paulo esteja se referindo ao ascetismo dos falsos mestres. Isso seria consistente com o contexto. Se for esse o caso, o versículo não teria nada a ver com a saúde física. Mas, para fins de argumentação, assumiremos que ele tem em mente o treinamento físico do ponto de vista da saúde.
O treinamento físico é inferior porque seus benefícios nunca permeiam “da vida presente e da futura”. O espírito é mais importante que o corpo. Quão inferior é o exercício físico? Se eu dissesse: “Tommy tem pouca força, mas Johnny é muito forte”, você não pensaria que Tommy é forte de forma alguma. Portanto, o propósito deste versículo não é apoiar o exercício físico, mas afirmar a superioridade da aptidão espiritual sobre a aptidão física. A maioria das pessoas não precisa de nenhum incentivo para ver a aptidão física como importante; em vez disso, eles precisam ter uma visão inferior da aptidão física em relação à aptidão espiritual.
Portanto, o uso adequado desse versículo é instar as pessoas a colocar menos foco na forma física, para que possam prestar mais atenção à sua saúde espiritual. É estranho que às vezes seja usado para validar o exercício físico quando ensina explicitamente que devemos enfatizar o espiritual. No entanto, o versículo não declara que o treinamento físico não tem valor. Paulo poderia ter escrito: “O treinamento físico é completamente inútil, mas a piedade é benéfica para todos os tempos”, mas não escreveu. O versículo certamente não ensina que o exercício físico é pecaminoso ou prejudicial. Portanto, o exercício físico é permitido como preferência, até mesmo uma preferência sábia, mas este versículo não o prescreve ou exige.
Filipenses 2:25–30 é uma passagem da qual podemos inferir algo sobre o uso de meios naturais para a saúde:
Contudo, penso que será necessário enviar de volta a vocês Epafrodito, meu irmão, cooperador e companheiro de lutas, mensageiro que vocês enviaram para atender às minhas necessidades. Pois ele tem saudade de todos vocês e está angustiado porque ficaram sabendo que ele esteve doente. De fato, ficou doente e quase morreu. Mas Deus teve misericórdia dele, e não somente dele, mas também de mim, para que eu não tivesse tristeza sobre tristeza. Por isso, logo o enviarei, para que, quando o virem novamente, fiquem alegres e eu tenha menos tristeza. E peço que vocês o recebam no Senhor com grande alegria e honrem homens como este, porque ele quase morreu por amor à causa de Cristo, arriscando a vida para suprir a ajuda que vocês não me podiam dar.
Paulo diz que Epafrodito ficou doente porque trabalhou demais. Isso implica que o problema era evitável. Se ele tivesse se permitido descansar, poderia ter evitado a doença. Homer Kent concorda:
A proximidade da morte de Epafrodito deve ser explicada em relação à sua doença (v. 27), e não foi resultado de perseguição ou de processo judicial adverso. Além disso, a doença era devida diretamente ao seu trabalho cristão em favor de Paulo. Talvez tenha resultado dos rigores da viagem e foi agravado por seus esforços para continuar a ministrar a Paulo, apesar de estar doente. Não foi apenas uma circunstância inevitável, mas foi o risco de sua vida no interesse de seu ministério.⁵
Nossas decisões podem influenciar nossa saúde. O descanso pode ajudar a evitar doenças. No entanto, esta é uma inferência desnecessária. A passagem em si não encoraja hábitos saudáveis, mas apenas oferece a razão da doença.
É alarmante que a passagem seja frequentemente usada para diminuir o ministério de cura, pois parece que ele não foi imediatamente curado, embora estivesse com o apóstolo. No entanto, esta é uma inferência impulsionada pelo desejo de extrair tal conclusão. O próprio texto indica que Epafrodito foi resgatado da beira da morte porque Deus mostrou misericórdia. Isso pode significar que Deus o curou com um milagre instantâneo após algum tempo, ou que Deus o curou por um milagre gradual, ou que o homem se recuperou por meios aparentemente naturais. De qualquer forma, não há nada no texto que diminua o ministério de cura ou endosse o uso da medicina.
O que está surpreendentemente claro é que enquanto Paulo magnifica a misericórdia de Deus nesta passagem e indica que isso resultou em cura, os eruditos bíblicos muitas vezes tentam diminuir o ministério de cura com ela. É assim que um coração perverso de incredulidade distorce a atitude e a percepção das pessoas.
Em uma carta a Timóteo, Paulo escreve: “Não continue a beber somente água; tome também um pouco de vinho, por causa do seu estômago e das suas frequentes enfermidades” (1 Timóteo 5:23). Talvez este versículo se aproxime mais de um apoio ao uso de meios naturais na saúde, mas resta-nos ver quanto apoio ele oferece ao uso da medicina.
A Bíblia estabelece como norma que devemos buscar em Deus saúde e cura por meio da fé (Mateus 8:17; Tiago 5:14–15). O versículo indica que é aceitável ajustar a dieta de alguém por razões de saúde, mas seria um caso óbvio de incredulidade e preconceito tomar este versículo escrito para um indivíduo específico e forçá-lo a ofuscar o número esmagador de passagens bíblicas que nos instruem a confiar em Deus para saúde e cura. Os eruditos cristãos muitas vezes tentam enganar as pessoas com tal manobra, mas é fácil perceber isso, a menos que alguém deseje aceitar a mentira porque ela justifica a incredulidade.
Se a Bíblia indica que é apropriado usar meios naturais como uma forma de manter nossa saúde, como este versículo parece nos dizer, então devemos aceitar isso. No entanto, devemos considerar quanto incentivo está realmente nos dando para usar meios naturais e quanto apoio está dando para o uso de remédio. Os que afirmam que ela constitui a norma e que aprova veementemente o uso de remédio negam o sentido claro do texto. O vinho não é o mesmo que remédio e é apenas um ajuste na dieta.
Como Ralph Earle escreve: “A palavra para vinho (oinos) às vezes é usada na LXX para… suco de uva não fermentado… Além disso, é geralmente aceito que o vinho da época de Jesus era geralmente bastante fraco e, especialmente entre os judeus, frequentemente diluído com água. Além disso, a água potável segura nem sempre estava prontamente disponível nesses países do leste”.⁶ Cleon Rogers concorda: “A ordem de abster-se exclusivamente de água potável pode ter sido devido ao fato de que a água contaminada contribuiu para a indigestão de Timóteo”.⁷ A declaração de Paulo equivale a uma instrução para Timóteo ajustar sua dieta para se adequar à sua situação específica.
Se um amigo tem um problema de saúde específico e eu o aconselho: “Pare de comer apenas carne, mas coma alguns vegetais”, seria um grande exagero dizer que isso constitui uma aprovação explícita para o uso de remédio. Assim, qualquer suporte que nosso versículo oferece à medicina permanece muito fraco, indireto e inconclusivo. No entanto, permanece que o versículo de fato torna aceitável ajustar a dieta de alguém por motivos de saúde.
Um argumento comum em apoio ao uso de medicamentos é que as substâncias naturais são inerentemente boas. Como Wayne Grudem escreve:
Deus… criou substâncias na terra que podem ser transformadas em remédios com propriedades curativas. Os remédios, portanto, devem ser considerados parte de toda a criação que Deus considerou “muito boa” (Gn 1:31). Devemos usar remédios de bom grado com gratidão ao Senhor, pois “Do Senhor é a terra e a sua plenitude” (Sl 24:1).⁸
No entanto, esta é uma falsa inferência da Bíblia. Só porque a criação de Deus é “boa” não significa que o que quer que façamos com as coisas criadas também seja bom. Se o argumento é que podemos usar remédios porque todas as substâncias criadas são boas, então não há razão para ser seletivo sobre isso — um cogumelo venenoso é tão “bom” quanto aquele que tem propriedades curativas.
Esse argumento também está associado a 1 Timóteo 4:4–5, que diz: “Pois tudo o que Deus criou é bom, e nada deve ser rejeitado, se for recebido com ação de graças, pois é santificado pela palavra de Deus e pela oração”. Isso tem sido usado para justificar a participação nas artes, esportes, política, todos os tipos de recreações e diversões, e feito para apoiar a noção de que todas as atividades são tão sagradas quanto o ministério do evangelho. Alguns até juntam isso com outras passagens para estabelecer um mandato para se envolver na cultura, de modo a se apresentarem como mais justos e obedientes do que aqueles que se concentram em questões espirituais.
No entanto, o versículo 3 diz: “[Eles] proíbem o casamento e o consumo de alimentos que Deus criou para serem recebidos com ação de graças pelos que creem e conhecem a verdade”. O foco de Paulo é diferente. Ele está mostrando que nenhuma substância é cerimonialmente proibida por Deus. Ele quer dizer que somos livres para casar e que podemos comer carne de porco, lagosta e todos os tipos de alimentos se os recebermos com ação de graças. Em vez de honrar esta mensagem de liberdade das restrições cerimoniais, os cristãos arrancam dele a passagem e a forçam a tolerar seus desejos e ambições mundanos. De qualquer forma, não oferece suporte ao uso de medicamentos.
A Bíblia não endossa o uso da medicina, mas não parece proibi-la. Há muitas tentativas de extrair um endosso da Bíblia, mas todos os argumentos saem pela culatra para aqueles que os afirmam, expondo sua incredulidade e dureza de coração. Ainda assim, não significa que devemos abandonar o uso da medicina, mas significa que devemos reduzir drasticamente nossa visão sobre eles.
Jesus diz: “Porque ele faz raiar o seu sol sobre maus e bons e derrama chuva sobre justos e injustos” (Mateus 5:45). Toda chuva vem de Deus, mas é um efeito de sua providência comum, e normalmente não nos referimos a ela como um milagre. No entanto, a chuva às vezes pode ser um milagre: “Elias era humano como nós. Ele orou fervorosamente para que não chovesse, e não choveu sobre a terra durante três anos e meio. Orou outra vez, e os céus enviaram chuva, e a terra produziu os seus frutos” (Tiago 5:17–18).
Da mesma forma, a cura pela medicina poderia ser atribuída a Deus, mas apenas no sentido de que nosso alimento diário também vem dele. Nossa comida vem de Deus, mas geralmente não no mesmo sentido em que Jesus alimentou milhares quando multiplicou os peixes e os pães. Devemos ser gratos por todas as provisões naturais, mas nunca devemos confundi-las com milagres.
Uma diferença importante é que a Bíblia faz da cura pela fé o padrão em vez da exceção (Mateus 8:17; Tiago 5:14–15), de modo que é inaceitável considerá-la um aspecto opcional da vida e do ministério cristão. Isso não quer dizer que aqueles que usam a medicina devam se sentir condenados ou que devam parar de tomar sua medicação. O ponto é que aqueles que falam como se a Bíblia apoiasse ansiosamente e explicitamente o uso da medicina estão errados — não há tal apoio na Bíblia. Em vez disso, ela nos ensina a aumentar nossa fé para a cura e nossa dependência do poder de Deus.
¹ Expositor’s Bible Commentary, Vol. 4; Grand Rapids, Michigan: Zondervan Corporation, 1988; p. 491.
² Expositor’s Bible Commentary, Vol. 12; Grand Rapids, Michigan: Zondervan Corporation, 1981; p. 204.
³ The Pulpit Commentary, Vol. 21, “The General Epistle of James”; Peabody, Massachusetts: Hendrickson Publishers; p. 71.
⁴ Alexander Strauch, Biblical Eldership; Lewis and Roth Publishers, 1995; p. 258.
⁵ Expositor’s Bible Commentary, Vol. 11; Grand Rapids, Michigan: Zondervan Corporation, 1978; p. 136.
⁶ Ibid., p. 381.
⁷ Cleon L. Rogers, The New Linguistic Key to the Greek New Testament; Grand Rapids, Michigan: Zondervan Publishing House, 1998; p. 497.
⁸ Grudem, Systematic Theology, p. 1064.
— Vincent Cheung. Healing and Medicine. Disponível em Biblical Healing (2012), pp. 30–40. Tradução: Luan Tavares (02/04/2023).
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