Sem Profecia, Sem Integridade

Não havendo profecia, o povo se corrompe; mas o que guarda a lei, esse é feliz (Pv 29.18).

A pregação da lei de Deus e o exercício da profecia são ambos necessários para que a humanidade conheça e obedeça a Deus. Muito já se falou sobre a escassez de sermões e ensinos sobre a lei de Deus, mas pouquíssimos se aventuraram a delinear a magnitude da perda para o reino de Deus que é a destruição do poder profético. Este livro, creio, veio suprir essa lacuna.

A síntese da doutrina da profecia é a seguinte. Deus criou o homem com total acesso à conversação face a face. Na queda, o homem fugiu da presença de Deus e buscou o caminho de independência. Mas durante o desenrolar do plano de salvação, Deus foi restaurando paulatinamente esse acesso interativo e imediato com o homem. Deus escolheu de um homem, Abraão, um povo para servir de instrumento e condutor das bênçãos redentivas de Deus para todo o mundo. A partir desse pai e desse povo, Deus começou a levantar profetas, homens e mulheres com parte do acesso a Deus que fora perdido no paraíso. Conforme a história da redenção avançava, maior ficava o número de profetas e maior ficava a quantidade e a profundidade das suas responsabilidades perante o povo. Quando chegou o Grande Profeta, Jesus Cristo, ele consumou o plano de salvação e assim liberou a todos os cristãos o poder profético, por meio do Espírito Santo com quem ele ungiu a sua igreja. Na nova aliança, todo cristão recebeu a concessão do poder do Espírito e pode agora profetizar, falar em línguas, receber visões e sonhos. Na sabedoria de Deus, os cristãos variam na intensidade dessa conversação com Deus conforme a sua fé, e, por isso, ele ordenou que alguns cristãos se dedicassem mais ao ministério profético público do que outros. Isso continuará assim até que vejamos Cristo face a face na ressurreição, conversando com ele para sempre.

No entanto, assim como Deus teve um plano de salvação, Satanás teve um plano de destruição, de tentar impedir a realização do plano de Deus. Assim, enquanto Deus levantou profetas, Satanás levantou falsos profetas. Em um conflito direto, os profetas de Deus sempre vencem. Por isso, a estratégia do diabo concentra-se em convencer os cristãos a descrerem dos profetas verdadeiros, a rejeitarem a realidade sobrenatural da profecia, a fim de que as hostes de Satanás governem o conhecimento sem precisarem brigar. E é aqui que entra o cessacionismo.

No meu livro sobre a cura, eu demonstrei que os cessacionistas são descendentes de Agar, e não de Sara, porque eles insistem em um Messias enquanto negam a promessa da cura — exatamente a mentalidade que governou as circunstâncias em que Ismael foi concebido. A descendência de Agar, conforme Paulo explica em Gálatas, vive em escravidão e persegue a descendência da fé, e era representada naqueles dias pela velha Jerusalém.

Agora, neste livro, eu apresentei outra razão para identificar os cessacionistas com cidade perseguidora: sua rejeição aos profetas de Deus. Os cessacionistas podem não derramar sangue literalmente, como os seus antepassados espirituais faziam, porque eles descobriram um método mais “limpinho” de se livrarem dos profetas: basta inventar um esquema teológico artificial e um conjunto de sofismas para inculcar na mente de todo mundo que não existem mais profetas, que isso era temporário até o fechamento do cânon. Em lugar de matar os profetas, previnem que eles cheguem a existir. Sua teologia é um anticoncepcional contra profetas. Mas a sua dureza de coração contra eles é a mesma, assim como a sua acepção de falsos profetas.

Embora a retórica deles seja veemente contra os falsos profetas, que para eles são todos os profetas, é impossível que eles decidam pela neutralidade. Combater os verdadeiros profetas sempre resulta em uma lacuna, que será preenchida inevitavelmente pelos falsos. Será realmente uma surpresa que o sucesso do cessacionismo tenha sido seguido rapidamente pelo sucesso do liberalismo teológico e do iluminismo? Aqueles que pensam que a era de ouro dos reformados e puritanos foi a maior maravilha espiritual da história não conseguem entender como que isso durou tão pouco e como os mundanos logo passaram a arruinar o restante da fé bíblica. Mas a verdade é que os cessacionistas já eram liberais, por rejeitarem as promessas milagrosas de Deus e por tornarem seções e temas da Escritura inaplicáveis, e eles pavimentaram o caminho do iluminismo kantiano ao negarem Jesus como o Profeta perpétuo, que comunica revelações pelo seu Espírito. A história da igreja está escrita errada.

Os falsos profetas dominam o mundo hoje. Os revolucionários e utopistas desde a Revolução Francesa se veem como os visionários de um mundo ideal e enganam muitos com suas palavras doces. Os estatísticos e especialistas de todo tipo sempre sabem o que vai acontecer. O “consenso científico” conhece o tempo de cada catástrofe ambiental e climática, e suas resoluções são seguidas por nações inteiras. Psicanalistas sondam o coração do homem como espíritos oniscientes. Jornalistas decidem quais são as novas verdades e as tomam compulsórias para o mundo inteiro, com a cumplicidade dos governantes. Tiranos comunistas criam planos e mais planos com presunção de infalibilidade, apenas para trazer mais miséria e destruição.

De quem é a culpa de que o mundo esteja assim? Dos cessacionistas. Eles removeram da terra os únicos que podem derrotar o ilusionismo dos falsos profetas, que são os verdadeiros profetas. Embora a pregação seja também valiosíssima contra as heresias dos falsos, o fato é que foi justamente a pregação cessacionista que acabou com os verdadeiros, e assim ela vem irremediavelmente corrompida para colaborar com os falsos. E hoje o mundo está ceifando o silêncio de Deus que os cessacionistas plantaram. A consequência é o barulho infernal da mídia, dos cientistas e dos especialistas, comandando a consciência coletiva do planeta inteiro e dirigindo os pensamentos de cada indivíduo como se fossem fantoches. Assim como a tal “crise do Covid-19” nunca teria acontecido se as igrejas estivessem curando enfermos aos milhares há séculos, também certamente nunca teria acontecido se as vozes dos profetas de Deus não houvessem sido silenciadas pela própria igreja. No tempo de Eliseu, até os reis pagãos sabiam que esse profeta trazia a revelação de Deus, de modo que o temiam ou o procuravam. Hoje, são os cristãos que imploram por orientação e previsão nas fontes pagãs.

Talvez você fique perplexo com o fato de os cessacionistas defenderem tanto a suficiência e a perfeição da Escritura enquanto a leem tão mal e a desobedecem tão sistematicamente. Na opinião deles, eles são os grandes guardiões da Escritura. Eles produzem livros incontáveis sobre a Escritura, fazem exegese da Escritura inteira, inserem a leitura da Escritura em cada momento do culto, tornam a exposição da Escritura o ponto alto das suas reuniões, defendem a apologética com os pressupostos da Escritura, gloriam-se de confissões e catecismos longos cheios de textos-prova da Escritura e, é claro, reclamam dos carismáticos por não fazerem nada disso. Então, não pode ser tão ruim, você diz. Mas qual é a diferença disso tudo para a religião judaizante dos tempos de Jesus? Aqueles homens também respiravam a Escritura e todas as suas tradições pretensamente baseadas na Escritura, e mesmo assim não a conheciam, e nem conheciam o poder de Deus.

Não julgue os cessacionistas com base na propaganda que eles fazem de si mesmos. Observe como eles leem e aplicam a Escritura. Preste atenção em como eles cometem traição contra as promessas de Deus abusando da própria Palavra de Deus para isso. Moisés disse “Tomara todos fossem profetas”, Joel disse “Nos últimos dias, todos serão profetas”, Pedro disse “Agora sim finalmente todos são profetas”, e os cessacionistas dizem “Ninguém pode ser profeta”. Paulo disse que as revelações iriam cessar somente quando Cristo voltasse, mas os cessacionistas dizem que já cessaram há muito tempo. Cessacionistas dizem que o Espírito Santo vem sem manifestações sobrenaturais, mas não há nenhuma instância na Escritura em que o Espírito veio despojado assim. Paulo disse “Procurai com zelo os dons espirituais, principalmente o de profetizar”; cessacionistas dizem “Esqueçam quase todos os dons, e principalmente nunca profetizem”. Paulo disse “Não proibais o falar em línguas”, cessacionistas proíbem. Paulo também disse que, nos cultos, cada um traz uma língua, ou profecia, ou cântico, ou interpretação, mas os cessacionistas não permitem que ninguém traga nada. Ele disse para não desprezarmos as profecias, mas os cessacionistas desprezam todas. Ele também disse que, no corpo de Cristo, todos os dons são importantes e ninguém pode dizer “Não preciso de você”, mas os cessacionistas afirmam explicitamente que categorias inteiras de dons são não só desnecessárias, mas inexistentes. Continue a lista como quiser. É rebeldia total. E suas justificativas são erros inacreditáveis de leitura, como quando usam um texto sobre a perpetuidade dos dons para argumentar pela cessação dos dons, ou quando usam a suficiência da Escritura contra o que ela mesma ensina, ou quando misturam o papel do profeta com o papel do levita e sacerdote. Por mais que tenham eloquência e diplomas, a competência de leitura deles é inferior à de uma criança. E isso não por falta de escolaridade, mas por um excesso de escolaridade nos caminhos da incredulidade. E daí que os cessacionistas façam tanto alarde das maravilhas da Escritura? Por acaso os comunistas também não fazem tantos discursos e propagandas em favor dos pobres enquanto os matam pela fome e pela bala?

O que importa se os cessacionistas combatem as superstições dos neopentecostais? Há algo mais fácil do que criticar pessoas que parecem caricaturas? A internet está lotada de videos cômicos de neopentecostais fazendo esquisitices. Quanta coragem, honradez e formação espiritual é necessária para dizer que os neopentecostais fazem besteiras? Difícil é criticar a própria tradição, cheia de requintes, retórica atraente e toneladas de argumentações intrincadas. Difícil é admitir que foi ludibriado esse tempo todo e partir para a fé nas promessas de Deus mesmo que isso tome você ligeiramente e exteriormente parecido com aqueles que você achava serem o lixo da cristandade e a vergonha do evangelho. Jesus disse que um profeta só não tem honra na própria terra e na própria casa. Talvez seja por isso que os cessacionistas tenham tanto medo de serem profetas: eles amam demais a zona de conforto da sua própria terra, da sua denominação e da sua tradição.

A promessa de Deus, no entanto, não falhou. O seu Espírito de profecias continua disponível a todos os que o buscarem com fé. Os profetas de Deus irão vencer assim que pisarem o pé no campo de batalha. É só isso que é necessário. Você pode começar na sua casa. Se você é pastor, um verdadeiro pastor chamado por Deus, comece o seu próprio discipulado. Retire-se da Babilônia, para não participar do juízo dela. Rompa com as cadeias da política eclesiástica e comece tudo de novo. Profetas de Deus sempre começam bastante sozinhos, mas pouco a pouco, como uma pitada de fermento que leveda toda a massa, você terá cem vezes mais familiares e casas do que tinha antes, e com isso a perseguição, e no final a vida eterna. Por todas as gerações, em todas as nações, homens e mulheres, crianças e velhos, serão profetas do Senhor, anunciando as suas maravilhas, vencendo o poder dos inimigos do evangelho, intimidando os reis da terra e humilhando os profetas de Baal.

— André de Mattos Duarte, excerto de O Espírito da Profecia: Uma defesa da continuação das novas revelações de Deus.