Profecia é Pregação?
Oliver Amorim
Um dos erros de leitura mais grosseiros dos cessacionistas é o de interpretar os textos bíblicos sobre profetizar como se fossem sobre pregar. Imagino que isso seja motivado por um constrangimento ao excluir esses textos de sua aplicabilidade em face da teoria cessacionista. Já que pega mal jogar textos como 1Coríntios 14 fora, é melhor reinterpretar para que se adeque às atividades que ainda permitimos.
Você provavelmente já ouviu a desculpa de que, embora a profecia como nova revelação tenha cessado, ela ainda permanece na pregação como uma “declaração da Palavra de Deus” já escrita. Isso é um ardil elaborado em cima de uma concepção totalmente errada do que é um profeta. O profeta não pode ser substituído pelo pregador só porque ambos “declaram a Palavra de Deus”. Pregadores e profetas têm essa generalidade em comum, mas suas práticas e seus ministérios são nitidamente distintos.
É a velha falácia do “Todos os gatos têm rabo / Todos os cães têm rabo / Logo, todos os gatos são cães”. E são a elite da apologética!
Profetas e pregadores são distintos pelas seguintes provas:
1. Todos os profetas na Escritura trazem revelações novas, inspiradas e imediatas. Sem exceção.
2. Todos os textos que abordam a atividade profética se referem à declaração de revelações novas, e não há um único texto sobre profecia que possa prescindir dessa interpretação com base puramente exegética. Inserir o assunto da pregação em textos sobre profecia é forçação de barra, é apenas o resultado de quem enxerga apenas o que quer.
3. Moisés já havia indicado “anciãos”, isto é, “presbíteros” sobre Israel seguindo o conselho do sogro, e mesmo assim depois precisou de 70 profetas cheios do Espírito Santo.
4. O ministério docente baseado no ensino das Escrituras foi entregue aos levitas (Dt 33), e a docência no contexto do culto caberia naturalmente aos levitas sacerdotes (Ml 2). Por outro lado, os profetas eram levantados por Deus individualmente para declarar novas revelações em qualquer lugar e para qualquer destinatário. Mesmo profetas que também eram levitas, como Jeremias e Ezequiel, nunca confundiram seus ofícios. Ensinar é uma coisa, profetizar é outra.
5. As regras para cada ofício diferem. Os pregadores e outros docentes eram apenas os levitas homens, a partir de 20 anos, e a restrição a homens adultos permanece no Novo Testamento, ao passo que o chamamento profético não tinha restrição de idade, tribo ou sexo. No Novo Testamento, existe uma ordenação criteriosa para os pastores, mas o Espírito da profecia foi derramado em “toda carne” — todos os crentes podiam profetizar. Além disso, os profetas estão sujeitos à pena de morte caso profetizem falsamente, enquanto não existe esse rigor para docentes que errem no ensino.
6. As “listas de dons” em Romanos 12, 1Coríntios 12 e Efésios 4 distinguem profetas de mestres. Detalhe: os profetas estão acima dos mestres. Será que é por isso que os mestres querem se livrar dos profetas?
Absorver a função profética dentro do ministério pastoral tem consequências graves. Os pregadores podem errar, porque contam com o próprio esforço para interpretar e explicar bem as Escrituras, mas os profetas verdadeiros sempre acertam, porque comunicam diretamente as palavras reveladas por Deus. Portanto, os profetas são os reformadores por excelência. Somente eles têm poder suficiente para derrotar os falsos mestres e para expor o coração de pastores secretamente desvirtuados. Sabe por que igreja não muda? Sabe por que a regra é sempre “os incomodados que se mudem”? Porque não há profetas, mas apenas mestres. Sem os profetas, os mestres só irão reformar na medida que quiserem. Olhe bem os profetas da Bíblia: eles determinaram o curso de reinos inteiros e desnudaram a perversão dos sacerdotes e escribas simplesmente ao repetirem os pensamentos imediatos de Deus. Sem eles, só resta a autocracia dos mestres com imunidade parlamentar.
Está na hora de despertarmos do estupor eclesiocêntrico e buscarmos novamente, e ardentemente, o profetizar (1Co 14.1). Todo cristão pode fazer isso. Talvez você não possa ser pastor ou mestre, mas, se você tem o Espírito, você pode profetizar. A igreja precisa de mestres e de profetas. A existência de um ministério não é opcional. O olho não pode dizer à mão “não preciso de ti”.
— Oliver Amorim