A Ideia Absurda de Necessidade
Vincent Cheung
Você pode ter ouvido dizer: “Deus nos dá o que precisamos, não o que queremos”. Às vezes isso é aplicado à vida em geral e frequentemente aplicado à oração. Esse clichê religioso está em contradição direta com a palavra de Deus. Ele se opõe especialmente aos ensinamentos de Jesus sobre a oração. É uma desculpa para a incredulidade. É um autoperdão pelo fracasso. O que quer que você tenha, pode dizer a si mesmo que é disso que você precisa. Se você se consolar dessa maneira, nunca terá de admitir sua deficiência. Afinal, você nunca terá de admitir que não é o gigante espiritual que pensa ser. Você nunca terá de dizer: “Deus não respondeu à minha oração por causa da minha incredulidade. Mas não vou inventar desculpas e não vou desistir. Eu vou me arrepender da minha falta de fé, vou revisitar a palavra de Deus e crescer na fé”.
A ideia de necessidade é absurda por si só. Você sempre pode precisar de menos. De fato, a necessidade é impossível de definir por si só. Você nunca precisa absolutamente de nada do que pede em oração. Você quer um bife, mas acha que só precisa de pão, então pede pão. Se você tem pão, não precisa de manteiga. Mas se o objetivo é sobreviver, você pode comer raízes de árvores. Você pode comer lixo. Você pode comer excrementos de animais. Então, no fim das contas, você não precisa de pão. Para começo de conversa, você precisa sobreviver? Se você é cristão, mesmo que morra de fome, Deus o aceitará no céu. Então tire sua cabeça do banheiro do cachorro e simplesmente morra. Mas quem disse que você precisa ir para o céu? Por que não queimar no inferno? Não há nada contraditório ou ininteligível nisso. Milhões de pessoas queimam no inferno. Mas note que você não quer queimar no inferno. Você quer ir para o céu, e é por isso que você precisa de Jesus Cristo. Bem, eu também não quero comer lixo e não quero comer só pão. Portanto, eu preciso do bife.
A necessidade é relativa. A necessidade não tem sentido sem um ponto de referência definido. Ninguém realmente precisa de nada — a menos que seja para conseguir o que deseja. Quando as pessoas definem necessidade, elas a definem pelo que desejam. Se precisam de pouco, é porque querem pouco, ou porque só ousam querer pouco. Esse desejo muitas vezes não é falado, mas é facilmente descoberto quando falamos sobre isso, porque inevitavelmente a necessidade é satisfazer o que eles querem alcançar. Talvez o desejo deles tenha um alcance e a necessidade seja definida pelo mínimo que satisfaça o que desejam, mas a necessidade ainda é definida pelo desejo. Quando forçamos uma dicotomia entre necessidade e desejo, a necessidade perde seu significado. A necessidade é relativa a algo, algum resultado desejado ou padrão desejado. A necessidade não se sustenta sozinha. Como a necessidade não pode existir por si só, não faz sentido dizer que Deus nos dá o que precisamos e não o que queremos, porque isso significaria apenas que ele dá o mínimo do que se deseja. Essa limitação perde o sentido se aumentarmos o desejo para que o mínimo também se torne maior.
Se eu quiser comprar uma casa, precisarei de centenas de milhares de dólares. Mas se eu quiser comprar uma mansão, precisarei de milhões de dólares. Você diz: “Mas você não precisa de uma mansão”. Mas eu quero, e quero muito. Há algumas pessoas que eu quero irritar e preciso de uma mansão para isso. Por outro lado, você nem precisa alugar um quarto. Muitas pessoas estão desabrigadas. Elas sobrevivem, assumindo que qualquer um de nós precisa sobreviver em primeiro lugar. Você não precisa de nada. No entanto, o que eu realmente quero é construir um estádio espacial para que possamos ter uma igreja na lua. Dependendo de quão espetacular eu queira tornar o lugar, isso pode me custar de cinquenta a trezentos bilhões de dólares. Então eu preciso de cinquenta bilhões de dólares, porque isso é o mínimo. Você diz: “Mas você não precisa construir um estádio espacial. Podemos ter uma igreja na terra”. Você também não precisa jantar na mesa. Você pode jantar no campo comendo grama com as vacas. Você não precisa de nada.
Porém, definir necessidade como o mínimo daquilo que desejamos ainda é bobagem. A Bíblia diz que Deus fará muito mais do que pedimos ou imaginamos. Claro que Deus nos dá o que precisamos. A Bíblia às vezes usa a ideia, mas não usa a ideia de necessidade para minimizar o que recebemos de Deus. Se eu desejo comprar o almoço e Deus me dá dez milhões de dólares por aquela refeição, então é claro que ele me deu o que preciso, porque só preciso dos dez dólares para realizar meu desejo. Não há nada inerente à ideia da necessidade de limitar o que recebo a dez dólares neste contexto. Vinte dólares supririam minha necessidade. Vinte trilhões de dólares supririam minha necessidade. Não há nada na ideia de necessidade que o restrinja a um mínimo de um determinado ponto de referência. Esta é apenas outra maneira de dizer que não significa nada dizer que Deus nos dá o que precisamos, não o que queremos. De fato, a Bíblia diz que Deus suprirá nossas necessidades, não de acordo com nossos padrões, mas de acordo com suas gloriosas riquezas em Cristo Jesus. Um homem pobre pode lhe dar vinte dólares, no máximo, para comprar um par de sapatos em uma loja barata. Um multimilionário nato pode lhe dar vários milhares de dólares para fazer um par personalizado, porque ele não sabe de mais nada. E para ele, esse valor significa que os sapatos são gratuitos.
Estamos explorando de várias perspectivas o quão sem sentido é a ideia de necessidade. E se a necessidade não significa nada para nós, significa menos ainda para Deus. Isso também responde a um possível desafio ao que consideramos até aqui. Ou seja, se a necessidade é definida por outra coisa, como o desejo, talvez ela não seja definida pelo nosso desejo, mas pelo desejo de Deus por nós. Em outras palavras, Deus nos dá o que precisamos conforme definido pelo seu desejo por nós. E assim não recebemos o que pedimos em oração porque Deus pensa que precisamos de algo diferente.
Do ponto de vista bíblico, esse desafio é respondido pelo que consideramos acima, ou seja, Deus supre nossas necessidades de acordo com suas riquezas, não de acordo com nossas necessidades. Além disso, quando Paulo disse isso, ele se referia às necessidades que seus leitores conheciam; de fato, ele estava se referindo especificamente ao dinheiro (Filipenses 4:15–19). Em outras palavras, Deus nos dá dinheiro de acordo com quanto dinheiro ele tem, não de acordo com quanto dinheiro precisamos. A questão é que não podemos dizer que Deus é quem define nossas necessidades de uma forma que não entendemos, ou que entenderíamos apenas olhando para trás. O clichê nos faria pensar que podemos ter uma necessidade ou desejo, mas quando oramos sobre isso e não recebemos o que pedimos, é porque Deus entende que nossa necessidade é outra coisa, e, em vez disso, ele nos dá o que ele acha que precisamos. O que Paulo disse refutaria isso, visto que ele se referiu às nossas necessidades como algo que compreenderíamos continuamente, tanto no presente quanto no futuro, e disse que Deus atenderia a essas necessidades.
No nível conceitual, a ambiguidade está embutida na própria ideia de necessidade. O próprio Deus enfrentaria o mesmo problema. Por que ele acha que você precisa de uma determinada coisa, ou por que ele acha que você precisa tanto disso? Ele ainda definiria necessidade de acordo com seu desejo. E sabemos o que Deus decidiu porque ele nos diz em sua palavra. Portanto, não é algo desconhecido. Assim, se Deus decide o que precisamos, o clichê permanece sem sentido porque sabemos o que Deus decidiu. Ele nos diz nas Escrituras. Se nos voltarmos para a palavra de Deus para definir o que Deus quer para nós, então esse clichê será destruído, porque não pode explicar desapontamentos inesperados e falhas inesperadas na oração como se pretende. Como sabemos o que Deus disse, tudo seria esperado. Mas então, por que deveríamos preservar a ideia de necessidade? Se o que Deus deseja e o que precisamos se tornam a mesma coisa (neste contexto, é o que precisamos por causa do que ele deseja para nós), então o clichê significaria que Deus nos dá o que ele deseja para nós, não o que desejamos para nós mesmos. Portanto, é tudo uma questão de desejo, e a necessidade torna-se novamente irrelevante. Além disso, lembre-se de que uma necessidade não impõe restrições ao que atende a essa necessidade. Se Deus acha que eu preciso de dez dólares para o almoço, ele ainda pode me dar dez trilhões de dólares. Isso atende muito bem a necessidade. A necessidade não tem sentido.
De qualquer forma, o ensino bíblico não é que Deus definirá nossa necessidade de acordo com seu desejo para nós, de modo que não receberemos o que pedimos. Repetindo, Paulo disse aos filipenses que Deus supriria as necessidades deles e, no contexto, essas eram necessidades que eles conheciam e eram definidas de acordo com o desejo deles, a percepção deles sobre suas vidas. Isso significa que o clichê não pode explicar expectativas frustradas, pois sabemos quais deveriam ser nossas expectativas. Além disso, se dissermos que Deus nos dá o que deseja para nós e não o que desejamos para nós mesmos, isso não significa automaticamente que receberíamos algo menos ou algo diferente daquilo pelo qual oramos. Mesmo que seja Deus quem defina quanto devemos receber dele (nos nossos termos, se é Deus quem define quanto precisamos de acordo com o desejo dele para nós), a Bíblia indica que receberíamos mais do que pedimos ou imaginamos. Teremos mais a dizer sobre isso logo mais.
O que eu estou fazendo? Estou mostrando a você que o clichê não tem sentido, não importa como o vejamos. Mesmo se pensarmos demais e abrirmos espaço para ele de todos os ângulos, não funcionará. Por si só, a necessidade não tem sentido. Você nunca precisa de nada. E é por isso que o clichê — “Deus nos dá o que precisamos, não o que queremos” — nos prepara para não conseguir nada. É dito por pessoas que não recebem nada de Deus, mas que se sentem hipócritas a respeito disso. As pessoas que estão pingando cura e prosperidade, com santidade e revelação, com fruto espiritual e poder milagroso, tendem a não dizer algo assim. Eles tendem a encorajar os outros a ter fé e progredir. Em seguida, mostramos que, mesmo que definamos necessidade por desejo, como deveríamos, o clichê ainda falha em ser significativa, independentemente de qual desejo usamos para definir nossa necessidade.
O clichê é pior do que inútil. É maligno. Imagine se seu filho tiver uma doença terminal. Embora você ore pela cura dele, ele morre. Então alguém lhe diz: “Deus lhe dá o que você precisa, não o que você quer”. Este homem zomba do seu filho bem na sua frente. Você não precisa do seu filho. Seu filho é desnecessário. E o seu filho? Aparentemente, ele também não precisava de sua própria vida. Mas e se ele quisesse viver? Então no fim das contas ele precisava de cura, não é? Em seguida, você ora pela salvação de sua esposa, mas sua esposa morre sem crer em Cristo e agora ela queima no inferno. Esse mesmo sujeito diz a você: “Deus lhe dá o que você precisa, não o que você quer”. Você sente que precisa dar um soco na cara desse sujeito. Veja — você acha que precisa, porque você quer. Ele zomba da condenação e do sofrimento de sua esposa. Então você não precisa que sua esposa vá para o céu. Ela pode queimar no inferno muito bem. Mas é bom para ela? E se ela não quisesse queimar no inferno? Então ela precisava conhecer Jesus Cristo, certo? O clichê surge de uma teologia sem fé, cruel e maligna. Isso é paganismo. Não é o ensinamento de Jesus. Não é a fé cristã.
Por que você quer comida para seus filhos, para que eles não morram de fome? Não é porque precisam de comida. Eles não precisam de nada. Eles podem morrer de fome. Qual é o problema? O problema é você — você não quer que isso aconteça. Então você pede o que quer, não o que precisa. Você trabalha duro para ganhar o suficiente para alimentar seus filhos, porque é isso que você quer, não o que precisa. Você só precisa disso porque você quer. É porque você quer esse resultado que precisa do dinheiro e da comida. Mas então, você também quer que eles usem roupas e frequentem a escola! Seu monstro! Quando você ficará satisfeito? Você precisa de alguma coisa disso? Eles precisam? Ninguém precisa de nada disso. Mas você quer tudo isso e muito mais. Você é insistente em seus desejos. Na teologia, as pessoas costumam chamar isso de ganância. Eu me refiro à teologia budista que aparentemente a maioria dos cristãos adota.
Contentamento e desejo não são mutuamente exclusivos. Você pode estar contente com a vida, mas querer mais da vida. Contentamento significa que você está feliz agora mesmo enquanto busca mais. Eu estou contente em Cristo, mas isso não significa que não desejo mais progredir na fé. Eu continuo buscando mais, mas não estou em agonia enquanto isso. Estou feliz agora e serei mais feliz depois. Isso é verdade em outros aspectos da vida. Você pode estar contente porque tem comida, roupas e abrigo, e deveria estar contente. Mas nesse estado de contentamento, você continua buscando mais. O contentamento o torna menos vulnerável às tentações e a ambição o torna menos vulnerável à estagnação.
No tanque de Betesda havia uma multidão de inválidos — cegos, coxos e paralíticos (João 5). Nenhum deles precisava de nada. Eles poderiam permanecer com suas enfermidades. Eles poderiam sofrer suas limitações e existência degradante até morrerem. Porém, se o ponto de referência era o desejo deles, então todos ali precisavam de cura. Todos eles precisavam de ajuda. Jesus aproximou-se de um homem e perguntou-lhe: “Você quer ser curado?”. Ele não perguntou ao homem: “Você precisa ser curado?”. Ele não precisava ser curado, a menos que quisesse ser curado.
Deus não pergunta a você hoje: “Você precisa da minha ajuda? Você precisa da minha graça? Você precisa do meu poder e sabedoria?”. Você poderia responder não. Você pode apodrecer em seus problemas. Você pode sofrer de depressão e doença. Você pode se afogar em dívidas. Você pode ser preso pelo pecado. Você pode até queimar no inferno — se quiser. Você não precisa de nada de Deus, isto é, a menos que queira ser salvo, a menos que queira ser curado, a menos que queira vencer na vida. Então, Deus está perguntando a você: “Você quer minha ajuda? Você quer minha graça? Você quer meu poder e sabedoria?”. Ele lhe dará o que você quer, não o que você precisa.
Dois cegos chamaram Jesus, e ele lhes perguntou: “O que vocês querem que eu faça por vocês?” (Mateus 20:32). Certamente, eles não precisavam de cura. Eles sobreviveram todo esse tempo como cegos. E eles realmente não precisavam sobreviver em primeiro lugar. Eles sobreviveram até este momento porque queriam sobreviver. Agora eles precisavam de cura, apenas porque queriam a cura. Está vendo a verdade? A doutrina contra o desejo na fé e na oração é uma doutrina fraudulenta que transforma nossa caminhada com Deus em um absurdo. Jesus não disse às pessoas: “Seja feito conforme a sua necessidade”. Mas ele disse: “De acordo com a sua fé, seja feito para você”. Precisando ou não de algo, seja lá o que isso signifique, se você tiver fé nisso, poderá conseguir o que quiser.
Os discípulos de Jesus falharam em curar um menino que tinha um demônio (Mateus 17:14–20). Eles não foram estúpidos o suficiente para dizer ao pai: “Deus nos dá o que precisamos, não o que queremos”. O menino realmente precisava de cura ou libertação do demônio? Ele havia sobrevivido por anos com a doença. E ele não precisava sobreviver em primeiro lugar. Eventualmente, ele teria morrido mesmo se tivesse recebido a cura. Ele não precisava de nada. Seu pai também não precisava de nada. Eles não vieram por necessidade, pois necessidade não significa nada. Ele queria cura para seu filho. Ele queria isso. Nenhum outro motivo foi exigido.
Então Jesus veio e curou o menino. Se o menino precisava de libertação do demônio, então por que Deus não lhe deu o que ele precisava quando os discípulos tentaram ajudá-lo? Se a libertação do demônio não era algo necessário, mas apenas algo desejado, então por que Deus deu a ele o que era desejado, mas não necessário, quando Jesus o ajudou? Qual era a diferença? Jesus disse aos discípulos que eles falharam por causa da falta de fé deles. A diferença era a fé. Quando os discípulos falharam, Jesus não disse: “Deus nos dá o que precisamos, não o que queremos”. Ele não aceitou o fracasso como uma revelação da vontade de Deus. Em vez disso, ele voltou para a situação e forçou o demônio a sair. Ele queria que algo acontecesse, então ele fez acontecer.
Se você tiver fé, Jesus disse que quando houver uma montanha em seu caminho, você pode dizer a ela para se jogar no mar, e ela deve obedecer a você (Mateus 21:21, Marcos 11:23). Se você tiver fé, Jesus disse que você pode ordenar que uma árvore seja arrancada e plantada no mar — um milagre que nunca é necessário — e ela deve fazer o que você diz (Lucas 17:6). Ele não disse que essas são coisas que ele poderia fazer porque era o Filho de Deus. Ele disse que seus seguidores poderiam fazer essas coisas. Deus nos apoiará, para que recebamos tudo o que pedirmos em oração, se tivermos fé (Mateus 21:22). Ele não disse que obteremos o que precisamos, mas obteremos o que pedirmos, o que acreditarmos e o que ordenarmos. Por um lado, temos a doutrina de Jesus: “Se queres que algo aconteça, manda que aconteça pela fé. Eu não me importo se é desnecessário, antinatural e até grotesco, faça isso acontecer à força”. Por outro lado, temos este clichê estúpido e mimizento: “Deus lhe dá o que você precisa, não o que você quer”.
Agora considere como Jesus alimentou milhares. Preste atenção, porque vamos examinar três passagens relacionadas (Mateus 14:15–21, Mateus 15:32–38, Mateus 16:8–11). Jesus alimentou milhares de pessoas pelo menos duas vezes em seu ministério. Em Mateus 14, ele começou com cinco pães e dois peixes (v. 17). Ele alimentou mais de cinco mil pessoas (v. 21) e sobrou doze cestos de comida (v. 20). Em Mateus 15, ele começou com sete pães e alguns peixinhos (v. 34). Ele alimentou mais de quatro mil pessoas (v. 38) e sobrou sete cestos de comida (v. 37).
Ele disse: “Não estou disposto a mandá-los embora com fome, para que não desfaleçam no caminho”. Assim, a necessidade foi definida por esse desejo. O que era necessário era definido pelo que era desejado. A necessidade não era permitir que as pessoas comessem até que estivessem cheias e não pudessem comer mais, mas a necessidade era permitir que as pessoas comessem apenas até que não estivessem com tanta fome que desmaiassem no caminho para casa. No entanto, em cada caso, havia tanto excedente que as pessoas não conseguiam terminar a comida. E se algum deles tentava levar alguma comida consigo, não conseguia carregar tudo, de modo que os discípulos tinham cestos inteiros de comida sobrando.
Em Mateus 14, Jesus começou com menos comida e tinha uma multidão maior para alimentar. Mas ele terminou com mais comida sobrando. Ou seja, em Mateus 14, ele começou com cinco pães para alimentar mais de cinco mil pessoas, e sobrou doze cestos de comida. E em Mateus 15, ele começou com sete pães para alimentar mais de quatro mil pessoas, e sobrou sete cestos de comida.
Aqui a necessidade e a resposta são especificadas. Somos capazes de observar como Deus responde à nossa necessidade em termos exatos e numéricos. Em ambos os casos, a Escritura demonstra que Deus responde suprindo muito mais do que precisamos. Ele responde à fé e à oração abafando a necessidade com um excedente esmagador. De fato, quando a necessidade é grande e nosso recurso é pequeno, ele responde com um excesso ainda mais escandaloso. Sua resposta é tão desnecessariamente excessiva que a medida da necessidade, ou a própria ideia de necessidade, torna-se irrelevante. Na verdade, agora a necessidade passa a ser como administrar o excesso (João 6:12).
Esta é a indicação mais confiável do que devemos esperar quando pedimos nosso “pão de cada dia” (Mateus 6:11). Não é um pedido modesto. Não pode significar uma quantia que mal nos permite sobreviver, enquanto continuamos a viver insatisfeitos e insatisfeitos e sem sobras. Mais uma vez, Jesus definiu a necessidade como apenas mandar as pessoas embora sem fazê-las desmaiar de fome, e Deus respondeu com um excesso esmagador. Não se esqueça — isso aconteceu quando Jesus queria apenas uma refeição para sustentar o povo. O que devemos esperar, se pedirmos suprimentos para um dia inteiro? E o que devemos esperar, se perguntarmos isso todos os dias? Nossa necessidade se tornaria como administrar a extravagante abundância que Deus lançaria sobre nós.
Depois, em Mateus 16, os discípulos entenderam mal que Jesus estava perguntando sobre o pão quando o usou como uma metáfora para alertá-los sobre a falsa doutrina (vv. 5–7). Jesus os repreendeu pela falta de fé deles (v. 8). Mas o que a fé tem a ver com isso? Se eles tivessem aprendido como Jesus alimentou milhares, isso teria eliminado de seus pensamentos a possibilidade de que a falta de pão algum dia fosse um problema. Visto que presumiram que a falta de pão era um problema, isso significava que ainda não tinham fé em Deus para prover. Por isso, Jesus os repreendeu por sua falta de fé e os lembrou da quantidade de comida que sobrou nessas ocasiões (vv. 9–12).
A fé nos permite ver as coisas da perspectiva de Deus. Assim, nos permite entender o que Deus quer dizer com o que ele diz na Escritura. Isso nos permite concordar com ele. A teologia torna-se direta e simples. Não teremos que inventar tradições e clichês para anular suas palavras. A falta de fé é a raiz do embotamento espiritual. Muitas vezes é exibida na insanidade desconcertante que vemos nos ensinamentos e discussões teológicas, e algumas das doutrinas que foram codificadas em credos e confissões. Estas são doutrinas inventadas pelo homem que tentam construir uma religião sem Deus. A incredulidade deixa as pessoas ESTÚPIDAS.
Anteriormente, eu mencionei que falaria mais sobre um assunto e agora estamos prontos para fazer isso. Percebemos que a necessidade não tem sentido em si mesma, mas é relativa a um ponto de referência, como nosso desejo. A incredulidade tenta retratar a derrota e o desapontamento como triunfo e, portanto, pode afirmar que o ponto de referência é o que Deus deseja para nós, não o que desejamos para nós mesmos. O propósito é destruir qualquer expectativa definida. Respondemos a isso de várias maneiras quando o mencionamos pela primeira vez, mas podemos reforçar o ponto.
Jesus foi a revelação da vontade de Deus na vida do homem. Se definirmos o que ele precisava pelo que desejava, então a necessidade era apenas comida suficiente para sustentar as pessoas em seu caminho de volta para casa. Mas Deus respondeu com um excesso avassalador, permitindo que o povo comesse até se fartar, sem saber quanto levava para casa, e ainda sobraram muitos cestos de comida. Assim, se definirmos o que é necessário pelo que Deus deseja para nós, podemos apenas concluir que a resposta não seria menos do que desejamos para nós mesmos, mas seria uma quantidade ainda mais excessiva que supera em muito o que somos capazes de pedir ou imaginar. Empurrar tudo para “a vontade de Deus” não reduz a expectativa do que devemos receber, mas aumentaria essa expectativa a um nível inconcebível para nós.
Para remover outro ensino condenável, Deus não nos dá algo categoricamente diferente do que pedimos e nos obriga a chamá-lo melhor. Quando alguém pede comida, Deus não lhe dá um câncer e depois ameaça o pobre coitado a confessar que Deus sabe do que ele realmente precisa, no fim das contas. Isso é paganismo. Este é o tipo de religião que faz com que as pessoas considerem a divindade com puro pavor — não reverência e admiração sinceras, mas o terror e a suspeita que alguém pode mostrar em relação a um monstro raivoso. Jesus queria comida para o povo, e Deus deu comida ao povo, só que muito mais do que eles precisavam. Sem truques. Só a graça.
Portanto, se uma necessidade é definida pelo que desejamos para nós mesmos ou pelo que Deus deseja para nós, ela só pode levar ao suprimento excessivo e ao sucesso. Não há espaço para incredulidade. O único lugar para um homem que propõe respostas modestas à oração é admitir que não acredita em Deus.
— Vincent Cheung. The Absurd Idea of Need. Disponível em Hero (2022), pp. 74–80. Tradução: Luan Tavares.